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quarta-feira, 27 de junho de 2012

SOM, ESPAÇO E MOVIMENTO: O CINEMA NA SUA ESSÊNCIA E A INVENÇÃO DE UM NOVA ESTÉTICA




 
Li em algum lugar que "Singing in the rain" (Cantando na chuva), o filme, comemora 60 anos. Não o vi, tinha apenas 5 anos quando foi lançado. Mas a cena de Gene Kelly cantando a canção de Arthur Free e Herb Brown no meio da rua constitui um dos momentos mais extraordinários da arte do cinema de todos os tempos. Sou apaixonado por esta cena desde que a vi pela primeira vez, há muitas décadas. Percebam o travelling (a viagem) da câmera. Aproxima-se e fecha no detalhe do sorriso de Gene Kelly e logo se abre para toda a amplitude do cenário, depois se afasta novamente para que o guarda-chuva gire infinitamente. As sensações brotam da tela e capturam nossas mentes e corações. "Singing in the rain", na minha opinião, inaugura o cinema moderno, tal como o conhecemos. Essa dinâmica de som, espaço e movimento, que combina de forma arrebatadora emoção e significado, tem aí o seu ponto culminante. O cinema dos anos cinquenta descobriu que um poste de luz não é apenas um poste de luz, não é apenas um objeto estático que decora o cenário. Um poste é, sobretudo, um ponto de apoio para subir, abrir os braços e saltar ao chão. Um poste de luz, no cinema, pode ser, na verdade, um pretexto para a ação, para o gesto, para o movimento. Tudo é ação: a vitrine da loja, o cordão da calçada (meio-fio), a água da chuva, os transeuntes, cada elemento do cenário está a serviço dessa lógica que vê no movimento uma forma de linguagem. Música, letra, interpretação, voz, dança, sapateado, cenário, coreografia, atores, personagens, fotografia, cor, luz, ritmo, tempo, montagem, sequência, som e movimento - em nenhum outro momento da história do cinema todos esses elementos foram reunidos em uma só cena com perfeição tão absoluta. Assistam e ouçam, levantem o som do computador, é o cinema puro, na sua mais definitiva forma de expressão. É intocável, é uma relíquia do século XX. É a invenção de uma estética que sobreviveu ao século XXI. Ninguém fez melhor até hoje. Em qualquer tempo e lugar.